domingo, 18 de novembro de 2007

Último capítulo

Para lá da janela do comboio o resto do mundo passa, correndo apressado.
Campos verdejantes, braços de rio com aves solitárias e um sol bem vermelho, que se põe lá ao fundo, junto à linha do horizonte, por entre os troncos finos dos pinheiros.
Nuvens de fumo levantam-se no ar por detrás dos arrozais.
É tempo de queimar as palhas, preparando os solos para um novo ciclo de colheitas.
A morte que se sucede à vida, no Outono de mais um ciclo.
Na próxima Primavera tudo renascerá de novo, numa sequência infatigável, perpetuando o milagre da criação.
Tudo o que nasce morrerá um dia, dia esse que tentamos adiar o mais possível, agarrados que nem lapas, à dádiva da vida.
Por isso me transporto hoje, neste comboio fumegante, numa viagem repentina ao passado e à memória.
Vi a morte bem de perto num quarto de hospital, onde seres enrugados e gastos lutavam por mais um dia … por outro nascer do sol, por uma última sardinha assada ou um derradeiro copo de vinho.
Será possível suportar um local querido, sem os seres que lá habitavam ? Com as suas memórias coladas às paredes e sussurrando por entre os livros ? Com os seus cheiros nas panelas, as suas covas nas almofadas e as marcas dos seus pés na alcatifa ?
Será ?
Por agora a vida parece ter dado mais uma hipótese àquele que me trouxe aqui. Mais uma volta no carrossel, mais umas folhas no calendário.
Que bom, que fortuna incalculável de minutos e horas …
Que as saibamos aproveitar … ele e eu ! Sem dúvidas, nem hesitações … sem tempo para amarguras, nem ressentimentos.
O último capítulo pode ter uma ou muitas páginas … não importa, o principal é que sejam todas boas!

( dedicado ao meu pai )

2 comentários:

Anónimo disse...

MUITO BONITO, DESEJO-VOS MUITAS E BOAS PÁGINAS.
DO AMIGO FP

Anónimo disse...

Que lindo!!! Até me vieram as lágrimas aos olhos...
Lita