Achei que alguns deles mereciam ser aqui publicados e por isso dou hoje início a esta nova secção do Zacarias:
O explorador
A floresta entrelaça-o com os seus sons gritantes, a mudança surge ao afastar de uma liana, as clareiras batem sonecas, ao sol morno de uma das quatro estações, em que pára o comboio que tem o tempo como único passageiro.
Por entre os ramos, os macacos executam o seu bailado, expressando estridentemente a sua alegria pelo reduzido volume da sua capacidade cerebral.
Um desabrochar de sons brota dos poros oxigenados do azul do céu.
O explorador retira o capacete de protecção, faz um buraco na terra húmida, com a profundidade de 20 cm e lá colocando a cabeça, retirando-se para pensar.
Robin dos Bosques aparece vindo de qualquer lado e exige-lhe o passaporte, com cara de poucos amigos.
Depois afasta-se montado numa das suas flechas e voa para outras paragens …
Os lanceiros da Guarda Real tocam as trompas, anunciando a sua presença, mas o explorador já voltara ao seu refúgio terrestre, onde fora raptado pelas minhocas, que o elegeram princesa e o aprisionaram no quarto mais alto da torre, com apenas aquela pequena janelinha, que dava para o bosque.
Telefonou imediatamente à loja dos animais, mas as rãs tinham sido uma espécie extinta, há alguns anos atrás.
Foi salvo por Tarzan, que às cavalitas de um dos seus macacos guarda costas (o reumático não perdoa) trepou pela hera e lhe emprestou um pára-quedas, com o qual se mandou pela janela.
Desceu, desceu … e foi aterrar na sala de audiências de um tribunal para delinquentes juvenis.
Dali foi conduzido sob escolta até uma gaiola cinzenta, onde ocupou o lugar de um papagaio ali residente e que fora expulso pela senhoria, já que não pagava a renda à mais de 3 meses.
Ali ficou detido, a comer alpista e a andar de balouço, durante algum tempo, até ser incorporado à força no Corpo Especial de Fuzileiros da Marinha Real, tendo lutado no Pacífico, pela posse das ilhas Fidji.
Finalmente passou à reforma aos 65 anos e ainda trabalhou como carteiro numa cidadezeca da província.
Após 10 anos de economias, quis voltar à selva.
Procurou no mapa e não a encontrou !
Por fim disseram-lhe que a selva tinha sido suprimida, por decreto já antigo do Ministro do Bem Estar Social.
Errou pelas ruas de aço e cimento armado, com o seu velho saco da tropa, apanhando os últimos grãos de areia, que ainda haviam entre as pedras da calçada.
Com eles encheu um canteiro, no interior da sua barraca e aí plantou umas velhas sementes, que encontrara nos bolsos de um velho casaco dos seus tempos de explorador.
Foi regando pacientemente e quando a floresta cresceu e invadiu toda a barraca, escolheu um cantinho, onde fez um buraco no chão , com 20 cm de profundidade.
Colocou lá a cabeça e retirou-se para morrer …
Lisboa, Agosto de 1979
2 comentários:
És tu que escreves isto Zacarias? Se és tu, estás de parabéns, escreves muito bem.
Lita
Sim, escrevi isto em 1979.
Obrigado pelas tuas palavras.
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